Cantoras interpretam João Donato com elegância em tributo bem reverente ao grande compositor de bossas e boleros


Gravações de Mart’nália, Mônica Salmaso, Tulipa Ruiz e Zélia Duncan estão entre os pontos altos do álbum idealizado para comemorar os 90 anos do artista. Capa do álbum ‘Elas cantam Donato’, programado para ser lançado amanhã, 30 de janeiro
Divulgação / Biscoito Fino
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Elas cantam João Donato
Artistas: Joyce Moreno, Luedji Luna, Mart’nália, Mônica Salmaso, Simone, Teresa Cristina, Tulipa Ruiz, Wanda Sá e Zélia Duncan
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ A ideia de um tributo feminino a João Donato (17 de agosto de 1934 – 17 de julho de 2023) faz sentido para quem sabe que muitas cantoras fizeram sucesso com gravações de músicas do compositor desde que o cancioneiro arejado do pianista acreano começou a ganhar letras em 1973.
Basta lembrar Fafá de Belém – responsável por propagar Emoriô (João Donato e Gilberto Gil) em gravação de 1975 que, 50 anos depois, ainda ecoa nas pistas com remixes de DJs e produtores – e Angela RoRo, intérprete original e definitiva do bolero Simples carinho (1982), parceria do compositor com o poeta e letrista Abel Silva. Sem falar em Zizi Possi, cuja voz cristalina propagou A paz (1987), canção de Donato com Gilberto Gil.
Álbum idealizado por Regina Oreiro para celebrar os 90 anos que João Donato teria festejado em 2024, o tributo Elas cantam Donato sai amanhã, 30 de janeiro, em edição da gravadora Biscoito Fino, com oito gravações feitas por nove cantoras.
Mart’nália está em casa no balanço de ‘Sambou, sambou’ (1964) em gravação arranjada por Itamar Assiere em clima de gafieira
Divulgação
A escolha do repertório é até certo ponto ousada, pois dá vez e vozes a algumas músicas menos conhecidas, caso da recente Azul royal (2022). Típica bossa ensolarada de Donato, composta com Maurício Pereira e lançada pelo autor no álbum Serotonina (2022), Azul royal tem os tons devidamente realçados por Joyce Moreno e Wanda Sá, duas cantoras afinadas com a bossa carioca do compositor. O arranjo do pianista Itamar Assiere imprime a devida leveza à gravação.
O mesmo Assiere brilha no arranjo de Lugar comum (1974), parceria de Donato com Gilberto Gil que ganha a voz de Mônica Salmaso em refinada e sedutora gravação, um dos pontos altos do álbum. Intérprete sempre precisa, Salmaso foge do (primoroso) lugar comum da própria discografia ao abordar a música com suavidade em clima quase etéreo, potencializado ao fim da gravação pelas notas salpicadas com delicadeza pelo piano de Assiere.
Outra parceria de Donato com Gil, Bananeira (1975) é replantada com certo suingue na voz de Luedji Luna em gravação com produção musical, arranjo e piano elétrico (Rhodes) do mesmo Itamar Assiere.
Arranjador de cinco das oito faixas do álbum Elas cantam Donato, Itamar Assiere também arma a cama para Mart’nália rolar no balanço de Sambou, sambou (1964), parceria de Donato com João Mello, em clima de gafeira.
Assiere também assina o arranjo de Surpresa (1999), uma das canções menos conhecidas do tributo, composta por Donato com Caetano Veloso e apresentada no Songbook João Donato na voz de Adriana Calcanhotto, intérprete de outra parceria dos dois compositores, Naquela estação (1990), esta também assinada por Ronaldo Bastos.
No tributo Elas cantam Donato, feito sob direção artística de Ivone Belém (viúva do compositor) e Regina Oreiro, Surpresa ganha registro à altura da canção na voz grave de Zélia Duncan. A faixa merece a primazia de abrir o disco.
Também de Donato com Caetano é Naturalmente (1975), música turbinada pelo arranjo enérgico de Gustavo Ruiz e pelo canto afiado de Tulipa Ruiz, artista afinada com o universo particular da obra de João Donato, com quem Tulipa chegou a gravar single e fazer show.
Sobra em Tulipa a afinidade com Donato que falta a Simone. Cantora que gravou Donato somente três vezes (entre 1987 e 1990), sempre sem repercussão, a Cigarra surpreende positivamente ao cantar com elegância o bolero Não sei como foi (2002) – uma das três parcerias de Donato com João Bosco – em gravação valorizada pelo arranjo jazzy de clima íntimo orquestrado por Marcos Valle.
Único ponto menos luminoso do disco, Verbos do amor (João Donato e Abel Silva, 1982) ganha o canto (pálido nessa faixa) de Teresa Cristina em gravação arranjada pelo violonista Lula Galvão.
No todo, há apuro no álbum Elas cantam Donato. E há também reverência quase excessiva na abordagem do cancioneiro de compositor que exalou modernidade em obra que soa atemporal.
Mônica Salmaso canta ‘Lugar comum’ (1974) com requinte e delicadeza com arranjo envolvente do pianista Itamar Assiere
Divulgação

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Lillian Morgan

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